quarta-feira, 29 de julho de 2009

Gripados?


As crianças, sobretudo as do tipo de sangue AB, são um dos grupos mais vulneráveis


Antes da interrupção durante o mês de Agosto, recuperamos a importância do ânimo e tipo de sangue, ao nível das causas, e do fortalecimento da imunidade e antioxidantes, no âmbito da cura gripal. À nossa disposição estão alguns dos mais poderosos antivirais: desde alimentos a suplementos alimentares passando pelos chás. Um contributo para que o H1N1, que há noventa anos matou dezenas de milhões de pessoas, possa agora ser vencido.

Texto e desenho* Dina Cristo

A gripe é efeito de agressão por um micróbio virulento, em que as defesas imunitárias não protegeram. Do ponto de vista da metafísica médica é sinal de fragilidade e significa que a pessoa (ou pessoas, no caso de uma epidemia) se deixa facilmente invadir por pensamentos, palavras ou gestos dos outros. Talvez se acuse(m), ainda que de forma pouco consciente, de ser(em) repugnantes ou ignóbeis. Para Lise Bourbeau o problema físico resulta de uma crença inconveniente que bloqueia o(s) desejo(s) e impede de realizar necessidade(s) legítimas da alma.
Para Kurt Tepperwein a gripe revela um conflito por resolver (cuja energia atrai germens patológicos) ou que não se enfrentou; uma obrigação, tarefa ou problema que se tentou evitar, não se admite ou está preparado para encarar. Segundo Hamer Ryke Geerd, citado por Lise Bourbeau, a infecção pertence ao grupo de doenças frias, aquelas em que o conflito está activo. Kurt Tepperwein complementa: quando se trata de uma doença aguda é sinal de que a causa é actual, quando é grave significa que o conflito é antigo e se mantém por solucionar. No caso da inflamação, como explicou Hamer Geerd, integra-se nas doenças quentes, quando o conflito foi resolvido e o corpo se está a restabelecer.
Estado de espírito contagia

Para que um contágio aconteça há diversos factores: os genes, a higiene, a exposição, a saúde pública, a idade
[1], estados já doentes, o cansaço, a susceptibilidade ou a sobrevivência. Mas três dos mais importantes são o humor, o sistema imunitário e o tipo de sangue.
Lise Bourbeau salientou que a infecção pode produzir-se numa pessoa pessimista e que é o próprio medo da agressão que a põe em contacto com pessoas e circunstâncias agressivas. Também Patrick Holford sublinha que a tensão, a depressão e o luto deprimem o sistema imunitário.
Max Hendel o havia referido: “(…) a realidade é que alta percentagem das nossas enfermidades é devida ao medo por parte do paciente”. E, lembra que a humanidade conseguiu aterrorizar as grandes criaturas mas t(r)eme perante as (mais) pequenas. Nos casos de humor mais baixo – não só o medo mas também os nervos, a preocupação, a raiva, o desânimo – destroem o poder de resistência do corpo e dão-lhe propensão para ficar doente.
No capítulo XIV, sobre a mente e a cura, do livro “Princípios ocultos de saúde e cura”, Max Heindel afirma categoricamente que “(…) o contágio vem de dentro” e explica-o. No dia-a-dia, o Ser Humano contacta com milhares e milhares de germens e parasitas: caso das moscas, do próprio leite, da água, das notas, das moedas… Contudo, nem sempre adoece.
O baço é, como recorda James A. Duke, em “Farmácia verde”
[2], o órgão no qual se agrupam as células combatentes do sistema imunitário. Max Heindel, já anteriormente, esclarecia: o baço é o órgão que atrai um veículo (composto de éter e energia solar) que assimila e através dele penetra o sistema nervoso do corpo humano, convertendo-se em fluído vital (rosado), através do qual os músculos se movem e os órgãos realizam as suas funções… vitais. A parte absorvida e não utilizada é depois irradiada para fora do corpo. Se for em linha recta significa que a pessoa possui um estado de saúde irradiante: «Nestas condições nenhum germe pode encontrar guarida no corpo. Não pode penetrar vindo de fora, porque estas correntes de força invisíveis o impedem da mesma [forma] que uma mosca não pode passar através de um ventilador em movimento.»[3]
Pelo contrário, quando o estado de humor baixa, o mesmo fluído é irradiado da periferia do corpo de forma decaída, dobrada e mais lenta – é como se, exemplifica o autor, diminuísse a voltagem ou cortasse parcialmente a corrente eléctrica. O corpo ao retrair-se, com pensamentos e/ou sentimentos negativos, deixa de absorver fluído vital em quantidade suficiente (e quanto menos assimilar pior será o estado de saúde), as forças quebram e o organismo fica vulnerável ao ataque e passagem dos micróbios: «(…) desde o momento em que permitimos que os pensamentos de temor, de preocupação, ira, desalento, etc., nos assaltem, o corpo procura fechar as portas, por assim dizer, contra todos os inimigos exteriores, imaginários ou reais. O baço fecha-se e deixa de especializar o fluído vital em quantidade suficiente para as necessidades do corpo»
[4].
Diz-me que sangue tens…

O tipo de sangue é, defende Peter J. D´Adamo, um factor crucial, dita a gravidade de uma infecção, dá determinada capacidade de adaptação, desenvolvimento de barreiras e afastamento no próximo ataque. A história da sobrevivência humana tem sido, atenta, de luta contra as doenças infecciosas: umas criam mais problemas para alguns tipos sanguíneos enquanto outros estão mais protegidos: «O tipo sanguíneo permite que o organismo resista a algumas doenças infecciosas e debilita e limita as reacções a outras»
[5].
Quase todas as doenças infecciosas, que influencia(ra)m a demografia - como a varíola, cólera, tuberculose, Peste Negra, malária, sarampo, diarreia, tifo, pneumonia - tiveram preferência por um tipo sanguíneo, especificamente susceptível e um outro, oposto, que é resistente. Por exemplo, o tipo O tem sido mais vulnerável à tuberculose e foi o mais atingido pela Peste Negra (yersina), que matou 1/3 da população; o tipo A às doenças cardíacas e ao cancro e o tipo AB à varíola.
No caso da gripe, uma doença virulenta, normalmente de tipo A e tipo B, tem assassinado milhões de pessoas desde o final do século XIX e continua letal. E se a vacina oferece alguma protecção, afirma, a verdade é que o vírus pode modificar-se e torná-la ineficaz: «No caso de algumas variedades do tipo A, já vimos surgir mutações inteiramente novas, contra as quais nenhum sistema imunológico tinha qualquer defesa. Naqueles anos, a gripe tornou-se pandémica, uma epidemia mundial que matou milhões e milhões de pessoas»
[6]. Uma contribuição para a mudança e progressão genética, na análise daquele médico naturopata e pesquisador.
Segundo Peter D´Adamo
[7], o tipo O é altamente susceptível às variedades mais virulentas; estão entre os mais atingidos nos anos em que o vírus está mais poderoso. Contudo, o O “Tem uma capacidade relativamente boa de gerar anticorpos contra os vírus comuns do tipo A (A H1N1, vírus da gripe espanhola que há noventa anos fez dezenas de milhões de mortos, e o A H3N2, responsável pela gripe de Hong Kong, de há 50 anos, e que fez quase um milhão de vítimas mortais). Tende a adoecer com mais facilidade por causa do primeiro do que do segundo. Tem uma reacção menos forte contra o vírus B.
O tipo de sangue A tende a contrair as formas menos virulentas do vírus e, se adoecer, a gravidade da gripe não é tanta. Demonstra capacidade de reagir rápida e substancialmente (e a capacidade de reagir rapidamente a um novo atacante é que marca a diferença entre ter uma constipação sem importãncia ou ficar uma semana de cama com gripe) contra o vírus A H1N1 e ainda maior contra o vírus tipo A H3N2. A reacção contra o vírus B da gripe é mais fraca.
O tipo de sangue AB possui uma capacidade relativamente fraca de gerar anticorpos contra qualquer vírus da gripe; é bastante indefeso contra todos eles (é ainda conhecido o H2N2 que, há mais de 60 anos, matou acima de um milhão de pessoas no mundo e ficou conhecido pela gripe asiática) e, para si, a gripe é, todos os anos, um problema.
O tipo sanguíneo B tem uma defesa mais fraca contra o vírus A H3N2 (este antigénio pode ser encontrado neles cinco meses depois de se terem recuperado da gripe, mesmo sem sintomas) e ligeiramente melhor contra o A H1N1. Tem muito mais vantagem contra as variedades de vírus do tipo B da gripe do que qualquer outro tipo de sangue. O antigénio é que despoleta o processo de resposta imunológica que termina com a produção de anticorpos. Um deles é a fucose, em que o leite humano é rico, que ajuda o bebé enquanto tal, a lutar eficazmente contra as infecções.
"Tropas" em combate

Outro dos factores decisivos é o sistema imunitário, cuja função é identificar e destruir os inimigos do organismo. As principais células imunitárias são, seguindo o mesmo autor, as B, T, macrófagos e glóbulos brancos ou leucócitos. As células B segregam anticorpos específicos que se agarram ao invasor, impedindo o(s) vírus de entrar nas células orgânicas e, portanto, de se apoderar do seu centro de controlo, reprogramá-lo e, por consequência, reproduzir-se.
As células T, ou linfócitos, vivem cerca de quatro dias e são produzidas no timo. São de três tipos: as T-auxiliares, que ajudam a activar as células B a produzirem antigénios, normalmente constituem o dobro das T-supressoras; estas, quando a batalha contra o invasor está ganha, terminam as reacções, e as NK, as “assassinas natas", uma vez que produzem toxinas capazes de destruir o agressor. Os macrófagos engolem e digerem os invasores já identificados pelas células B e T – é a fagocitose. As que operam especificamente no sangue denominam-se monócitos.
Assim que um invasor é identificado são produzidas novas “tropas”, colocadas em “fortalezas” como as amígdalas, o apêndice, o baço ou os gânglios linfáticos. Patrick Holford, em “A bíblia da alimentação”, lembra que o sistema imunitário tem a capacidade de produzir, num minuto, um milhão de anticorpos e de reconhecer, e desarmar, biliões de antigénios - os invasores cujos principais canais de acesso são os pulmões e o tubo digestivo.
Já no Séc.XIX Louis Pasteur havia notado que seria mais eficaz apostar no fortalecimento do sistema imunitário do que uma estratégia orientada para a destruição dos invasores, como aconteceu. Só hoje, com o aumento de agentes infecciosos e resistentes aos medicamentos – venenosos para o organismo, como sublinha Patrick Holford – é que a atenção se volta para a imunidade natural, como é o caso do interferon.
Perdoar e alegrar

Para a descobrir qual a crença que está a bloquear o(s) desejo(s) e a impedir de realizar necessidade(s) legítimas do Ser (Interno) Lise Bourbeau propõe, no seu livro «O teu corpo diz “ama-te” – a metafísica das doenças e do mal-estar
[8]», a resposta a três perguntas: 1. a)- Descreva o que vive no seu corpo; b)- Qualifique como se sente com este problema; 2.a)- O que é que o mal-estar o está a obstaculizar na vida? b)- Isto (resposta à 2.a) impede-lhe de ser o quê na sua vida? 3. a)- Se se permitisse ser (resposta à 2.a.) que lhe poderia acontecer de desagradável ou inaceitável? b)- Nesse caso, como se julgaria? c)- Como julga que os outros o julgariam?[9]
A mesma autora sugere sete etapas do perdão: 1.Identificar as emoções. 2. Tomar responsabilidade pela escolha de reagir com amor ou com medo. 3. Aceitar o outro e renunciar. 4. Perdoar-se; permitir ter direito a ter (tido) medos, crenças, fraquezas. 5. Mostrar desejo de exprimir o perdão. 6. Ver a pessoa em questão; exprimir o que se viveu e pedir-lhe perdão pelas acusações feitas. 7. Fazer a ligação com uma situação ou decisão face a um parente. Refazer (todas) as etapas com essa pessoa (ainda que seja o próprio).
Lise Bourbeau recomenda ainda tomar contacto com a força interior, reconhecer a capacidade de afirmação e deixar de acreditar que deve mostrar-se fraco, frágil ou vulnerável para obter atenção ou amor dos outros. No caso de uma inflamação, não pensar que está doente, mas agradecer ao corpo por se estar a regenerar e, em caso de dores, quando o conflito está activo, enfrentar o problema e resolvê-lo - decidir e aplicar consequentemente a determinação.

Prevenir

São várias as indicações, consoante os autores, para manter o sistema imunitário forte e saudável. Peter D´Adamo indica o seguimento de uma dieta específica para o seu tipo de sangue, nomeadamente os alimentos benéficos, que funcionam como remédios, a redução do stress e a toma de suplementos (não anti mas) probióticos, bactérias benéficas para a saúde humana, nomeadamente a estirpe lactobacillus salivarius, que é boa para adultos, como salienta Patrick Holford, para quem só sucumbimos aos micróbios quando estamos em baixo e a melhor cura é a prevenção.
O fundador do Institute for Optimum Nutrition recomenda, além de um conveniente estado de espírito e de uma adequada alimentação, relaxamento e meditação, que aumentam a contagem de células imunitárias. A importância do exercício físico advém de proporcionar a circulação do líquido linfático ao movimentar os músculos e, através dos vasos linfáticos, levar os invasores até aos “fortes” para ali serem destruídos.
Max Heindel defende(u) além da exercitação física também a actividade mental, um estado de ânimo de alegria e esperança como o melhor dos remédios e aconselhou uma crença sincera na saúde: «É uma lei que, se pensamos em saúde, acabaremos forçosamente por exprimi-la, tarde ou cedo»
[10]. Deixou orientações no sentido de uma vida racional, sensata, livre de excessos, dando ao corpo alimentos puros, procedentes do reino vegetal, a obediência às leis da vida e a demonstração da fé e optimismo com obras.
Dietas

Segundo Patrick Holford a dieta ideal para estimular a capacidade imunitária passa por uma quantidade suficiente de gorduras essenciais – existentes nos óleos de semente extraídos a frio -, muita fruta – como melancia, laranja e kiwi -, legumes frescos - como cenoura, beterraba (incluindo a rama), tomate e batata-doce -, sementes moídas, cereais integrais – como o arroz – e peixe; deve evitar-se carne e alimentos alérgicos.
O mesmo autor exemplifica ainda. No caso do sumo de melancia, pode desfazer a polpa e as sementes, pois são ricas em proteínas, zinco, selénio, vitamina E e óleos essenciais, e beber um litro por dia. Pode fazer uma sopa de cenoura, com três destes legumes, dois tomates, agriões biológicos, pedaços de tofu, leite de arroz (ou soja) e amêndoas ou sementes moídas. Poderá igualmente preparar uma grande salada com favas, brócolos, cenoura, beterraba, courgette, agrião, alface, tomate, abacate, pedaços de tofu, alho esmagado e óleo extraído a frio.
Patrick Holford aconselha a comer pouco (mas assegurando uma quantidade suficiente de proteínas), a manter-se quente e a evitar os lacticínios, já que a infecção viral tende a aumentar a produção de muco. A estas juntam-se sugestões de Peter D`Adamo: uma mistura concentrada de mirtilo, cereja, maçã e sabugueiro.
Durante uma infecção, quer o invasor quer o próprio sistema imunitário produzem radicais livres – substâncias químicas perigosas, as toxinas - que podem ser combatidas com nutrientes antioxidantes, que desintoxicam o organismo. São igualmente muito recomendados estimulantes da imunidade natural, o interferon – que desarma os espigões dos vírus, ligando-se a eles - e os antivirais – sobretudo quando a infecção está instalada, mas também como manutenção, embora em doses mais baixas, e mesmo em resfriados.
Nutrição adequada

Peter J. D´Adamo indica o Zanamivir, remédio que reduz os sintomas quando já ocorreu a infecção e previne-a por completo, e o sabugueiro, que inibe a repetição de todas as variedades do vírus da gripe. Patrick Holford receita especificamente o extracto de bagas de sabugueiro, o Sambucol, em uma colher de sobremesa três a quatro vezes por dia: acelera a recuperação, reduz a duração da gripe e impede o vírus de se instalar; tem a propriedade de inibir a acção da enzima neuraminidase, que cobre os espigões minúsculos dos vírus com que penetram na membrana da célula, furando e destruindo a parede celular.
A vitamina C - mais eficaz do que o AZT, defende Patrick Halford - é, segundo este autor, um nutriente de elite para estimular a imunidade: ajuda ao amadurecimento das células imunitárias, protege-as dos radicais livres, estimula a produção de interferon, melhora o rendimento dos anticorpos e macrófagos, é antiviral e capaz de destruir as toxinas. Os vírus não conseguem sobreviver num ambiente rico em vitamina C. Com uma grama (equivalente a mil mg) por dia tem um efeito protector mas, mesmo em manutenção, pode ir até às três gramas diárias; em caso de combate a infecções poderá atingir entre seis a 10 gramas diárias, de preferência com a primeira toma ao acordar e a última ao deitar. São fontes desta vitamina o camu-camu, a acerola, pimentos verdes, melão-cantalupa, kiwi ou, ainda a título de exemplo, o ananás.
A vitamina A fortalece as paredes das células (mantém a integridade do tubo digestivo, dos pulmões e de todas as membranas celulares) afastando os vírus e impedindo-os de entrarem no corpo. É, segundo Patrick Holford, um poderoso antioxidante, que se pode tomar, para manutenção, 7500 Unidades Internacionais (UI) por dia, mas, como pode ser tóxico em grandes quantidades, só deve ser ingerido, em caso de infecções, durante uma semana, entre 10 mil a 25 mil UI por dia.
Nas vitaminas, a E, antioxidante, que melhora o funcionamento das células B e T, e que se encontra nos frutos secos, sementes, glúten de trigo e óleos extraídos a frio, pode ser tomada, em caso de infecção, entre 500 a mil UI por dia; para estimular a imunidade, sobretudo em conjunto com o selénio, pode ser a partir dos 100 UI/dia. As vitaminas B – nomeadamente B1, B2, B5, B6, B12, também são “amigas” das células imunitárias.
Quanto à alimentação, é benéfico o alho, cebola, cogumelos medicinais ou gengibre, por exemplo. O alho contém alicina, uma substância antiviral, e enxofre, que actua como antioxidante; pode ser ingerido um dente por dia e, em caso de infecção, dois a seis. James A. Duke
[11] indica 10 por dia, em molhos, sopas, pão… Os cogumelos, designadamente o maiitake, reishi ou ganoderma, contêm polissacáridos que estimulam a imunidade; o shiitake possui, além disso, através do composto lentiname, propriedades antivirais.
A cebola, embora menos potente do que o alho, tem propriedades antivirais semelhantes. Em caso de resfriado, o autor do livro “Farmácia verde” propõe que se tome a intervalos, como se de um xarope se tratasse, lascas cruas demolhadas, durante uma noite inteira, num pouco de mel. O gengibre, por seu lado, contém quase uma dúzia de compostos antivirais, muitos dos quais também se encontram na curcuma, o açafrão-da-índia. São recomendadas duas colheres de raiz de gengibre fresca triturada, numa chávena de água a ferver, às quais pode juntar um pau de canela.
Com o gengibre pode combinar o chá de unha-de-gato, antiviral com alcalóides que estimulam a função imunitária: duas gramas por dia, para manutenção e até seis em caso de infecção, quatro vezes por dia. O alcaçuz contém oito compostos antivirais activos - como a glicirrizina, que inibe vários dos processos envolvidos na reprodução viral – e leva o corpo a libertar o interferon. Devido ao seu sabor, pode ser usado como adoçante. À forsítia e madressilva pode ainda juntar-se a erva-cidreira, um dos chás antivirais mais habitualmente utilizados.
Alternativas

Nos minerais, o zinco é um dos mais importantes, é crucial para a produção e funcionamento adequado das células imunitárias, especialmente as B e T, mas deve ser tomado com cuidado. Em alguns casos só no combate à infecção, numa dose entre os 15 e os 50 mg por dia: «(…) o seu excesso pode suprimir a capacidade de os macrófagos destruírem as bactérias. A ingestão diária ideal é de 15 a 25 mg. Apesar de o zinco poder ser um suplemento benéfico durante uma infecção viral, pode não ser uma boa ideia tomá-lo no decurso de uma infecção bacteriana. O mesmo se aplica ao ferro»
[12]. Além deste, estão envolvidos na antioxidação, o manganésio, o cobre ou o selénio, um mineral que abunda nos mariscos e nas sementes de sésamo e pode ser tomado 100 gr. para manutenção e entre 200 a 300 gr. diárias, em caso de infecção.
Se preferir gotas pode optar pelo extracto de caroço de toranja, o Citricidal, antiviral que possui um efeito semelhante ao dos antibióticos, mas não danifica as bactérias benéficas dos intestinos. Pode tomar-se cinco gotas por dia, em manutenção, e entre 20 a 30, em caso de infecção. Não é, contudo, conveniente tomá-lo depois de já ter assimilado probióticos. A serpentária, a chamada banha da cobra, é também uma substância antiviral que, em caso de infecção, é receitado entre 10 a 15 gotas de extracto concentrado três vezes por dia.
O betacaroteno (também fonte de vitamina A), é um antioxidante que se encontra nos legumes frescos bem como nos alimentos vermelhos, laranjas e amarelos. Sugere-se um sumo de cenoura e/ou melancia, por exemplo, ou então a toma de um suplemento entre 10 mil a 25 mil UI por dia, em caso de infecção - reduzida para 7500, quando em manutenção.
Para enfrentar uma infecção viral, Patrick Holford refere também o aloés, antiviral e estimulante da imunidade; uma a três gramas por dia de lisina, de astrágalo (ou alquitera) e de ácido caprílico; duas a três gramas de glutationa e cisteína, aminoácido antioxidante; uma a duas colheres de sobremesa, por dia, de pólen de abelhas; 50 a 500 mg, diárias, de hipericão ou milfurada; 200 a 500 mg de hidraste, que aumenta o fornecimento de sangue ao baço; 100 a mil mg também diárias de artemísia ou artemigem; óleo de cameleira, cardo mariano, alcachofra de Santo António, extracto de bagas de mirtilo, picnogenol, ácido lipóico e bioflavonóides.
A esta lista James A. Duke junta equinácea (mastigar a raiz), o zimbro, que contém um composto antiviral (a deoxipodofilotoxina), o eucalipto, que contém vários compostos antivirais. Em caso de um suplemento antioxidante, este deve ser de boa qualidade e com elevada potencia, defende Patrick Holford; deve integrar 20 mil UI (6600mcg) de vit.A, 300 UI de vit. E, 100 mg de vit.B6, 20 mg de zinco e 100 mcg de selénio.
Para os casos de resfriados James A. Duke propõe, além de uma canja com alho, cebola, gengibre e pimenta, 30 gr. de agrião fresco em salada, que pode combinar com o gengibre, para a tosse e coriza; uma chávena de manhã e outra à noite de uma a duas colheres de anis macerado em meia chávena de água a ferver durante 10 a 15 minutos, depois de coado; alteia e outras malvas; juntar cerejas-bravas maceradas à limonada; a raiz do ulmeiro-vermelho, alivia a tosse e garganta; o chá com flores de verbasco ou barbasco, um expectorante, além das já referidas serpentária, em infusão, e casca de salgueiro, que acalma a dor e é anti-inflamatório.

* Anos 70 [1] As principais vítimas da gripe são, normalmente, os recém-nascidos e idosos, um dos grupos mais vulneráveis. [2] DUKE, James A. - Farmácia verde, Publicações Europa-América, 2004. [3] HEINDEL, Max - Princípios ocultos de saúde e cura. [4] HEINDEL, Max - Princípios ocultos de saúde e cura. [5] ADAMO, Dr. Peter – Viva melhor com a dieta do tipo sanguíneo, Ed, Campus, 2001, pág.370. [6] ADAMO, Dr. Peter – Viva melhor com a dieta do tipo sanguíneo, Ed, Campus, 2001, pág.374/5. [7] ADAMO, Dr. Peter – Viva melhor com a dieta do tipo sanguíneo, Ed, Campus, 2001, pág.374. [8] BOURBEAU, Lise - O teu corpo diz “ama-te” – a metafísica das doenças e do mal-estar, 4ª reimpressão, 2007, pág. 391. [9] Interpretação proposta pela autora dos resultados obtidos: 1. o que vive face á pessoa ou situação que desencadeou o mal-estar. 2. O(s) desejo(s) bloqueados. 2.b)- Necessidade legítima do Ser bloqueada pela crença três. 3. Crença maléfica que bloqueia o(s) desejo(s) e impede de realizar a necessidade, criando o problema físico. [10] HEINDEL, Max - Princípios ocultos de saúde e cura. [11] DUKE, James A. – Farmácia verde, Publicações Europa-América, 2004. [12] HOLFORD, Patrick – A bíblia da alimentação, Editorial Presença, 2ª ed., 2004, pág. 164.

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quarta-feira, 22 de julho de 2009

Pódio do domínio


A dias de completarmos dois anos de publicação regular, reflectimos sobre a importância da transição da comunicação (social) instintiva, baseada na competição, para um novo padrão de comunicação e informação intuitiva, orientado para a cooperação.

Texto Elton Rodrigues Malta desenho* Dina Cristo


A competição é o grande motor da nossa sociedade. Ela é um dos instintos mais básicos do Homem. É o despique que surge quando o seu orgulho é ameaçado. Esta realidade retrata o comportamento animal que está em nós. Agimos tal e qual os cães quando são postos em confronto nas lutas clandestinas: picam-nos e viramo-nos contra os nossos semelhantes. Somos autênticos animais a viver na lei da sobrevivência, em que quem não come é comido. A disputa dá-se no sentido de cada um salvar-se. A TV serve-se disso e dirige-se à parte instintiva, alimentando-a, por ser a única em que este domínio fácil é possível. Ela manipula através da exploração do instinto.
É um dia de Primavera, apelativo à expansão. O Sol brilhante contagia com vida todos os seres e entre fauna e flora uma criança brinca alegremente, feliz pela liberdade de poder explorar e preenchida pelas novas aprendizagens. Eleva-se na generosidade tornando-se continuamente mais humana. Ela salta, ri e aprende. Canta, dança e celebra. Impulsionada pela luz, ela move-se no caminho da mudança, da realização e satisfação pessoal. Mas entretanto as nuvens começam a tapar o Sol à medida que ela questiona. Os pais prendem-na em casa, apenas podendo espreitar pela primeira janela que encarcerou o ser humano. Através desta janela consegue ver os seus pais. Imita-os por depositar inteira confiança neles, segue-lhes os exemplos sem hesitação. Tendo eles a noção de serem seguidos por alguém desamparado e desprotegido, têm a responsabilidade de educar, mas negligenciam-na. São eles os pais que dão à luz as trevas. Por quererem a criança obediente prendem-na na ignorância tirando as suas dúvidas com respostas como “Porque eu digo”. Dão-lhe uma aparente comodidade que lhe limita os horizontes. Ela perde a vontade própria e o desejo de questionar o mundo. Na idade dos porquês já ela diz “porque sim”. A vida tornou-se cinzenta, cada vez mais morta, e já só o desinteresse respira. O único estímulo capaz de mover a criança é a necessidade de mostrar não ser inferior.
Absorvida pela ruidosa e assustadora programação, foi-lhe sugada a autonomia. A violência da competição, oferecida de forma repetitiva, e criando um sentimento de culpa, condu-la ao escuro da prisão. Já não quer explorar, quer a garantia que tudo é estático e conhecido, recusando o mistério, optando pela frustração do “conforto” conformado. Como não sente satisfação pessoal entra na competição social devido à necessidade de aprovação que é inerente a qualquer ser desamparado. O sufoco mais intenso é sentido com o medo mais primitivo, o de ficar sozinho, e perante a ameaça constante - “assim o pai não gosta de ti” - a criança passa a ser como os pais querem que seja. Ser bom não chega, tem de ser melhor, porque os pais dizem que “a nota não está má mas a do filho do vizinho é melhor” e também dizem que “a prima é mais magra”. Criados os padrões de bom comportamento, só lhe resta segui-los e competir para se destacar. Rebaixa-se na competição tornando-se continuamente mais instintiva. Começa a nível pessoal e expande-se ao social. A criança é a massa e os pais são os meios de comunicação. Como são meios sem princípios só eles sabem quais os seus fins.
A disputa é uma forma de manipulação. Quem compete quer-se superiorizar para poder manipular o outro. No entanto quem tenta manipular está a ser manipulado por um conflito, está a reagir consoante o que o adversário faça deixando o seu centro de decisão para partir para o suposto que lhe é dito pelo exterior. Basicamente a pessoa sai de si, abandona-se para ser melhor que alguém. O que é estranho é que compete através da imitação e pouco a pouco a autenticidade e a diferença desaparecem, “aproximam os seus comportamentos aos dos outros” como diz Ana Flores. É sabido que quando adversários se confrontam durante muito tempo tornam-se cada vez mais iguais por se focarem demasiado no outro. Mas é ridículo tentar-se provar que se é melhor quando no fundo se imita. É contraditório. Mas a televisão promove o ataque a quem foge à regra, a quem não se mantém na linha da imitação.
A competição está enraizada de tal forma que por vezes nem é perceptível. Ela começa logo numa educação competitiva. Ensinam a criança, de forma subtil, que a forma de superar o desamparo é através da luta com os outros, ou seja, da busca da aprovação (oscilar consoante as opiniões) em vez da protecção das suas emoções, e “quem não segue o rebanho é banido” diz Ana Filipa Flores. O manipulador só se deixa dominar se vir que daí pode vir a exercer domínio. Como não sente que tem valor suficiente, precisa de algo que lhe diga que o tem. Esta disputa tem de ser alimentada porque se deixar de haver necessidade de competir, isto traduz-se numa estabilidade e resulta numa incapacidade de dominar.
Alimentar a cadeia A prisão da insegurança tem uma aparente saída que é a competição. Na verdade é uma extensão (infinita) dessa mesma prisão. Os media não são criadores desta concorrência, são um produto dela, contudo têm nas suas mãos a capacidade de a enfraquecer em vez de a cultivar. Quando criam padrões em que os pares são aprovados por certos comportamentos estão a incentivar a insegurança. Quando os jornalistas entram no conflito da venda, promovem a agitação e pressa e consequentemente as notícias saem copiadas impedindo a inovação. A competição é constante. Como ela só existe na necessidade de aprovação e esta só é possível na insegurança devido a cada pessoa não se conhecer a si própria, a TV impulsiona a ignorância. “A televisão é um meio de moldar mentes” diz Luís Mouzinho. O que quer que ela faça mexe com o auto-conceito das pessoas para que elas entrem novamente no despique. Alimenta este conflito ainda que de forma subtil.
A rivalidade na TV é perceptível tanto ao nível do conteúdo, nos programas escolhidos, como ao nível da forma, na linguagem usada. Ao nível do conteúdo ela existe no Top 10, mostrando que ser bom músico não chega, e vai influenciar o ouvinte a escolher as mais ouvidas para pertencer à maioria. Está presente em programas como “Quem quer ser milionário” tanto na competição pelo dinheiro como pelo saber. Ela é evidente aquando da publicação de escândalos de famosos de modo a diminuir o complexo de inferioridade das pessoas comuns perante essa figura pública. A publicidade faz apelo constante ao consumo daquele produto para que pareça o melhor, já que é o que mais se ouve falar.
Ao nível da forma basta ver a linguagem bélica presente no futebol quando os media se dirigem a este: “A selecção humilhou no jogo contra a Suíça”, “O Benfica está na luta pelo título”, “Ronaldo fuzilou o guarda-redes”. Há mais interesse na derrota do adversário do que na própria vitória. Sentir que deu o seu melhor não é suficiente, é necessário sentir que alguém é inferiorizado, porque o superior consegue manipular. Mas afinal quais destes desportos prendem os telespectadores? Não há uma cultura de contemplação e fusão. Há antes uma de distracção e alienação. “Temos uma televisão que atrofia a reflexão e a parte humana mais elevada”, segundo Luís Mouzinho.
O apelo constante à competição alimenta a agressão e o instinto. Leva a uma sociedade bruta, animal. O instinto é-nos inerente mas temos a liberdade de o alimentar ou não. Podemo-nos prender no instinto ou libertar na introspecção. Temos uma tendência, mas os media podem ser uma preciosa ajuda no combate a esse hábito.
Da pertença à partilha Baseado na divisão feita por Osho, filósofo indiano, acima do nível instintivo considerarei dois níveis: o racional e o introspectivo. No nível racional há uma reflexão que vai diferenciar as reacções das pessoas devido a terem diferentes conhecimentos e interpretações. No entanto o racional ainda compete, ainda que seja com saberes. Onde há competição há sede de poder. Esse poder implica domínio. O domínio mata a liberdade.
No nível intuitivo ou introspectivo, devido a conhecer-se a si mesmo, o sujeito conhece também a realidade e a natureza das coisas, vendo-a com nitidez. Não se deixa cegar pela areia mandada para os olhos através dos media. É livre. E quem é livre não pode ser dominado ou forçado a fazer algo, logo não compete, age por si. E mesmo que seja preso fisicamente continua a ser mais livre do que a nossa sociedade dita democrática, porque continua a ter vontade e pensamento próprios.
A libertação não reside em conhecimentos teóricos e exteriores, consiste em aplicar conhecimentos internamente, como se fosse uma semente que dará frutos para o mundo. Para isso é necessário serem transmitidos conhecimentos aplicáveis em cada pessoa. E a televisão como exemplo que é, deve transmitir histórias com sábios ensinamentos e com ânimo, que dêem força e promovam a diferença e autenticidade, que sejam uma ajuda a lidar com a vida e que ensinem as regras do jogo que ela é, em vez de ajudarem a abandonar o jogo pela incapacidade nascida da ignorância. Deve explicar leis universais, tais como a lei de causa-efeito, lei da atracção, ou até como usar o pensamento de forma a conduzir correctamente a vida. Pode também facultar técnicas de meditação e ir dando esse exemplo, estimulando a sua prática. Incentivar à expressão de cada pessoa através das várias formas de arte, pois estas ajudam a conhecermo-nos a nós próprios. Como diz Samael Aun Weor “Quando não há um auto-conhecimento, a auto-expressão dá-se pela auto-afirmação”. A difusão de conhecimentos da psicologia filosófica é essencial para que haja um conhecimento de si próprio, e posteriormente possa actuar cada um em si mesmo. Cultivar a capacidade de reflexão e a interpretação dos acontecimentos da vida são componentes da filosofia, que também deve ter o seu espaço. O desporto deve continuar sempre presente, mas o desporto de entrega e não o desporto de competição.
Devem ser divulgados os avanços científicos e tecnológicos de modo a impulsionar a sua contínua evolução, estabelecendo a ligação entre os interessados e estudiosos do assunto. A crise ecológica deve ser abordada através de medidas de preservação e recuperação do património, havendo um aprofundamento das perspectivas de ver a questão. Deve haver novos valores-notícia para a escolha e modo de abordagem dos acontecimentos, ajudando a elevar a frequência a que vibra o pensamento das massas. Dar na televisão o exemplo da leitura, contagiando. Todos os temas e problemas sociais devem ter espaço para debates, mas debates que têm como fim a verdade e não a razão. Esclarecer a sexualidade e educar as pessoas neste campo para que este tema não seja um tabu para fazer dinheiro. Em vez de estimular o atrito entre governantes e governados (por todos quererem o poder), incentivar a que cada um dê o seu melhor no seu lugar. Todos participarem na democracia, executando o seu trabalho com ética. Aqui está a verdadeira generosidade, partilha e solidariedade: dar a liberdade ao outro com todo o respeito.
A distracção deixa de ser necessária, simplesmente desliga-se a televisão e vai-se viver a vida fora da prisão das quatro paredes, já que as paredes da repressão já estão quebradas. O auto-conhecimento é fundamental, porque nenhuma revolução verdadeira ocorre do exterior. Para haver mudança é necessário operar no interior. Comunicar é descobrir e unir o que há de comum, e o comum a todos os seres humanos é o que têm de mais profundo. Assim se estimula a confiança e consequentemente surge a autonomia, estando de volta a vontade de explorar e aprender, de transformar e crescer. Tem-se de volta a vontade própria. Os media sozinhos não conseguem fazer toda esta mudança, mas conseguem influenciar na mudança do sentido para onde a nossa sociedade se dirige.
A partilha deve ser de todas as informações havendo livre acesso, e não uma selecção que permita manter o domínio. Partilhar é destituir poder. Partilhar postos, sem uma hierarquia fixa em que é preciso conflito para a mudar. Não criar posição dominante nem de dependência. Dar e receber. Libertar.

* Anos 70

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quarta-feira, 15 de julho de 2009

Voz da liberdade

Pela morte de Palma Inácio, recordamo-lo nas acções das Brigadas Revolucionárias e cobertura da então Voz da Liberdade.


Texto e fotografia Tânia Santos


As rádios clandestinas desempenharam um papel preponderante no período de maior instabilidade do Estado Novo. A Voz da Liberdade gritou, encorajou, divulgou e lutou até à chegada do 25 de Abril de 1974.
Quarta-feira, 1h15m em Lisboa: começa mais uma emissão clandestina da Voz da Liberdade em directo de Argel, capital e maior cidade da Argélia. A luta contra o regime ditatorial português e o colonialismo continua com um novo programa de informação e de combate.
Ouve-se uma voz conhecida. É o político e poeta Manuel Alegre, um dos colaboradores mais ouvido da Voz da Liberdade e um apoiante das Brigadas Revolucionárias (BR).
Estamos em 1972 e Alegre entrevista o “camarada André Sérgio”, nome fictício de Carlos Antunes, o fundador e a força das BR em conjunto com Isabel do Carmo. Falam dos atentados levados a cabo pelas BR, organismo organizado que através das suas acções armadas inquietava o Estado Novo.
O “camarada André Sérgio” reforça a ideia de que não havia forma de salvaguardar os militantes forçados a lutar na Guerra Colonial. O objectivo das BR era abrir caminho para a criação de um exército revolucionário dos trabalhadores, mas sem se resolver o problema do “partido do proletariado” (organização revolucionária que integra todos os revolucionários) não era possível abrir esse caminho para a acção revolucionária socialista, concretiza “André Sérgio”. Aos milhares de militantes que congregam as brigadas juntam-se muitos pensadores.
O fundador das BR defende que a luta ideológica sem prática não tem significado, daí que todas as ideias das BR se transformassem em actos revolucionários. A força, coragem e iniciativa caracterizam os militantes das brigadas. Contrariam ao mesmo tempo que intervêm no campo. Arriscam a vida pela liberdade do país.
Uma hora e quinze minutos do dia 10 de Março de 1973, a Voz da Liberdade difunde três acções revolucionárias desenvolvidas pelas BR. Com estas acções, os militantes tinham como objectivo destruir documentos que obrigavam os portugueses a irem para a frente da guerra colonial. Estas e outras acções só viram frutos depois da queda do regime, a 25 de Abril de 1974.
Nas ruas da capital portuguesa assiste-se a várias explosões de comunicados das BR. Pequenos panfletos voam, caem no chão e nas mãos das pessoas. Vêm confirmar os atentados levados a cabo pelas brigadas. Os comunicados, tal como as rádios clandestinas, divulgavam as acções armadas de forma clandestina. Utilizavam técnicas de forma a não revelarem a identificação dos subversivos.
Apesar de clandestina, a rádio Voz da Liberdade tinha bem definido o seu objectivo e encontrava-se organizada como todas as rádios. Estava dividida por secções, maioritariamente, ligadas a assuntos antifascistas, nomeadamente as secções “resistência antifascista e lutas populares” e “os fascistas falam”.
As BR desabrocharam na década de 70, criando as acções armadas contra o regime ditatorial. Desencadearam a primeira operação a 7 de Novembro de 1971 que consistiu na danificação do comando de uma base da NATO, perto da Fonte da Telha (Lisboa). Antes desta acção já eram desenvolvidas muitas outras organizadas e não organizadas com a mesma finalidade: acabar com o regime.


O homem
Palma Inácio foi um dos homens de maior acção contra o regime ditatorial. Numa altura em que acções ainda não eram organizadas, esteve envolvido em vários atentados, que o levaram várias vezes à prisão.
Uma hora e quinze minutos, a Voz da Liberdade noticia a detenção de Palma Inácio. A 17 de Maio de 1967, o revolucionário participou no assalto à dependência do Banco de Portugal na Figueira da Foz, sendo que confiscou cerca de 30 mil contos. Depois desta acção, fugiu para Paris, mas acabou por ser detido.
O Governo Português pediu à França a extradição de Palma Inácio, deixando o Governo francês no meio de um dilema: devolver o prisioneiro ao seu país de origem para ser lá julgado/censurado ou defender o revolucionário do regime do seu país, assumindo os seus ideais democráticos (liberdade e igualdade.
Em 1967, depois da detenção de Palma Inácio, a referida rádio emite vários noticiários relativamente à situação de Palma Inácio. Pede incessantemente a todos os democratas portugueses emigrados em França para se imporem e manifestarem contra o regime português: “A VOZ DA LIBERDADE saúda os democratas portugueses que se encontram em França a solidarizarem-se com Inácio Palma, a denunciarem as manobras da PIDE e a cerrarem fileiras na luta comum contra o fascismo” (emissão de 11/10/1967).
A luta armada, ou seja, acções contra o Estado Novo desencadeadas por militares ou grupos civis organizados de índole político-militar, aparece, em 1970, com o nascimento da Acção Revolucionária Armada (ARA). Auxiliar do Partido Comunista Português, a ARA impulsionou o aparecimento das BR, que se revelaram mais persistentes. A ARA suspendeu as suas actividades armadas em Maio de 1973. Contrariamente, as BR continuaram a actuar em força, e apenas desapareceram depois da destruição do Estado Novo. Concentraram-se, pela última vez, sete dias depois do 25 de Abril de 1974 no concelho de Torres Vedras.
A Voz da Liberdade surgiu em 1963, no contexto da Frente Portuguesa de Libertação Nacional (FPLN). Começou por emitir apenas às quartas-feiras e mais tarde passou a ter tempo de antena também aos sábados. Sempre à mesma hora, 1h15m, horário português. Lutou para travar a guerra colonial, terminar com a ideologia vigente e criar iniciativas contra a repressão. E conseguiu! Contribuiu para a consciencialização do povo português e da comunidade internacional.
Sábado, 14 de Outubro de 1967. Termina mais uma emissão com um apelo à população: “unamo-nos na acção contra a PIDE e contra o fascismo, unamo-nos na luta pela liberdade”.

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quarta-feira, 8 de julho de 2009

São Tomé sentido


Mauro

A sul da linha do Equador existem cores, olhares, sorrisos, vida, sabores, alegria, odores… uma ilha perdida no Atlântico que dá pelo nome de São Tomé e Príncipe. Visitamo-la agora que está perto de assinalar 34 anos sobre a sua independência.

Texto e fotografia Catarina Tagaio

A lua despede-se e o sol começa lentamente a iluminar a ilha de São Tomé. O relógio pára quando ali poisamos e as horas do mostrador (cinco e meia da manhã) marcam o início da jornada. Visitar São Tomé implica entrar no ritmo das pessoas que ali vivem… sentir a alegria que os são-tomenses sentem, sorrir como os são-tomenses sorriem, sentir como os são-tomenses sentem, viver a vida sem stress, de forma “leve-leve”. E é como são-tomense que vamos fazer esta viagem… devagarinho, de forma “leve-leve!”.
O verde abundante forra árvores e montanhas, o azul imenso pinta céu e mar, há cheiros e sabores que pairam pelo ar… Os nossos sentidos ficam presos a este quadro; dezenas de olhares curiosos aproximam-se da pista do aeroporto onde malas e caixotes formam um “fora de quadro” insignificante quando comparado com a “verdadeira” obra de arte.
Uma visita ao mercado local é a primeira etapa da nossa estadia. Aqui há cores, há odores, há sabores… Aqui todos os nossos sentidos são “activados”. Cenouras, pimenta, coco, fruta-pão, matabala
[1], carambola, limas, jacas, bananas de vários tipos (banana-prata, banana michelle, banana-maçã, entre outras) enchem bancadas e são pretexto para ouvirmos um:
- “Amiga, dez mil dobras!”
Os olhares brilhantes das vendedoras e os sorrisos abertos das crianças que as acompanham levam-nos a conhecer toda a beleza da ilha. Nestes olhos podemos ver cascatas, roças, praias e gentes que vivem em todos os recantos.
À saída do mercado dezenas de táxis oferecem uma viagem diferente. Entramos no primeiro e rumamos até à roça de Bombaim. Aqui, provamos o famoso fruto mangustão e mergulhamos nas águas frescas e límpidas da cascata de São Nicolau. Seguimos caminho e encontramos a roça de Agostinho Neto. A casa grande da roça faz-nos sonhar e por momentos somos teletransportados até à década de 70 do século passado.
Vemos a produção do cacau a todo o gás, senhoras nobres passeiam com os seus guarda-sóis, crianças cantam e dão gargalhadas estridentes, o sol brilha… mas de repente uma nuvem tapa o sol. E o sonho acaba! Subimos à roça de São João dos Angulares onde João Carlos Silva
[2] nos aguarda com o seu famoso “calulu de peixe”.
Para finalizar a visita a estas “mini-ilhas” aceitamos o desafio do taxista: uma visita a uma “roça anónima”. Abade recebe-nos de braços abertos. Por momentos também nos sentimos parte desta grande família. Uma criança chora quando vê uma “branca” aproximar-se. Abade não conhece turistas nem “gentes do continente”. A cidade fica longe e a estrada que as liga é de difícil acesso. Mas há magia neste pedacinho de terra e é com saudade que deixamos esta nossa “nova” família.
Abandonamos o táxi e seguimos de boleia num jipe. O sul da ilha é a próxima etapa. Entramos num barco e em vinte minutos chegamos ao Ilhéu das Rolas. O resort do ilhéu oferece-nos um quadro diferente. O azul imenso e o verde brilhante mantêm-se mas como pano de fundo encontramos agora bungalows de madeira e piscinas povoadas de turistas. Visitamos o marco que traça a linha do Equador e é aqui que sentimos pela primeira vez o calor húmido que nos abafa. E é com um pé no hemisfério Norte e outro no hemisfério Sul que regressamos a São Tomé.
Há tempo ainda para um mergulho nas belas praias que cercam a ilha e são muitas vezes utilizadas como página principal do grande livro que é São Tomé. Sete-Ondas encanta-nos com a sua areia escura e com as suas conchinas originais; Micondô faz-nos entrar na história de Miguel Sousa Tavares e imaginar os encontros de Luís Bernardo e Ann; Jalé delicia-nos com as suas ondas enormes; Praia Piscina hipnotiza-nos com a sua beleza natural.
A nossa aventura por terras são-tomenses parece estar a chegar ao fim… Café & Companhia é uma das nossas últimas etapas. Bebemos um sumo natural de goiaba, de sape-sape ou de manga e comemos uma grande fatia de bolo de chocolate enquanto o ambiente é invadido por música ao vivo. Fora destas quatro paredes um grupo de crianças aguarda-nos com dezenas de colares feitos com sementes.
- “Amiga, colar por trinta mil dobras!”
-“Amiga, troco colar por esses ténis!”
- “Amiga, amiga, amiga…”
O sol começa a deitar-se… Ouvimos música ao longe e pé ante pé aproximamo-nos. Algumas crianças dançam “puita
[3]”. É delicioso ver a forma como sentem a música. Anestesiados com todo este ritmo continuamos a nossa viagem. O nosso jipe é levado por uma onda de carros até uma discoteca. Entramos e lentamente começamos a sentir a música. Experimentamos dançar tarrachinha[4] mas… a hora do voo aproxima-se. É preciso fazer check-in e regressar a Lisboa. Lentamente o céu cobre-se de nuvens e o cheiro a terra molhada invade-nos. Numa fracção de segundos relembramos toda a nossa aventura por terras são-tomenses e sentimo-nos plenos.
Já no céu vemos São Tomé adormecido. O pico do Cão Grande que ao longo do dia nos serviu de farol brilha com a luz da lua… e de forma “leve-leve” passaram seis semanas!.

[1] Planta geralmente utilizada na culinária são-tomense. Espécie de batata. [2] Apresentador do programa “Na roça com os tachos” [3] Dança típica de São Tomé. [4] Kizomba.

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Literatura portuguesa VII


Nesta sétima parte, focamos a influência castelhana no século XVII em Portugal: os grandes doutrinadores e moralistas e a perfeição da prosa portuguesa com D. Francisco Manuel de Melo.

Texto e desenho Dina Cristo

D. Francisco Manuel de Melo (1608-1666) é em Portugal a personificação mais acabada da cultura aristocrática peninsular na época da Restauração. É um típico representante da sua classe na época, dada a sua larga experiência, e é um dos polígrafos peninsulares com mais variadas facetas. É bilingue. As suas produções líricas são classificadas em nove partes, abrangem quase todos os géneros na península e pretendem fazer a síntese das principais escolas poéticas da literatura espanhola.
Alguns dos seus trabalhos de historiografia são “As epanáforas” (a epanáfora amorosa é uma narrativa do descobrimento da Madeira por um par amoroso inglês e inclui reflexões acerca da saudade portuguesa), títulos de novelas, duas biografias (“Teodósio” e “Tácito”). Publicou em castelhano “Obras Morales”, que inclui temas de meditação ascética, uma vida de Santo Agostinho e de S. Francisco de Assis.
Em português redigiu os “Apólogos Dialogais”, três textos de crítica de costumes – “Relógios falantes”, “Escritório avarento”, “Visita das fontes” e também o “Hospital das letras”, primeira revisão crítica geral de autores literários. Entre os seus escritos moralistas o mais conhecido é a “Carta de guia de casados”. Escreveu muitas obras apologéticas quer a favor dos privilégios da nobreza quer a favor da Restauração. As matérias políticas foram sempre, tal como as militares, da sua especial predilecção. Para o teatro escreveu o “Auto do fidalgo aprendiz”.

Ideário

D. Francisco Manuel de Melo teve uma educação jesuíta e cortês, era o tipo humano do aristocrata de sangue e de espírito, cosmopolita (pelas viagens e imensas leituras). Detestava a vida de campo que só aconselha em determinadas fases da vida. Viveu a Restauração e exaltou as glórias literárias nacionais. Acompanhando o barroco peninsular, D. Francisco procura manter na sua prosa um sabor arcaico e popularizante. D. Francisco é um conservador, mas acomoda-se bem às circunstâncias do seu tempo. Dá uma grande importância à teoria política, como em “O Hospital das Letras”, em que critica o maquiavelismo. Este moralismo restringe-se à esfera individual e política pois socialmente ele considera a prostituição, a bastardia, a roda de enjeitados, as desigualdades de classes males necessários.
No “Escritório avarento” denuncia muitas podridões sociais através da autobiografia de duas moedas, uma de alto curso, outra de troca; mostra a omnipresença do dinheiro, apresenta as moedas como símbolos de conclusão conformista – o dinheiro nada teria de mau em si, pois uma vez criadas as desigualdades sociais ele modera os apetites - o único mal consiste na avareza que o transforma de meio legítimo em fim vicioso. O dinheiro está justificado por ser meio de troca, padrão de valor e também capital já que a sua acumulação permite comprar também o trabalho alheio.
D. Francisco preconiza uma grande preponderância do marido, sendo muito natural a dependência imposta às senhoras. Todas as aventuras amorosas dos jovens fidalgos solteiros são para ele naturais, enquanto a mulher passa da tutela dos pais para a do marido. Esta deve viver em reclusão completa, vigiada nas suas relações e sem cultura, mas D. Francisco não as julga muito menos dotadas de espírito que o homem. O problema das relações matrimoniais parece ter sido obsessivo no autor: além da “Carta de guia de casados”, dedicou-lhe a écloga moral e várias cartas.
Sob o ponto de vista filosófico-religioso, D. Francisco é formado dentro da escolástica jesuíta. Tal espelha-se na inquietação do barroco contra-reformista. Inclina-se para as matemáticas e o mecanicismo científico não passam despercebidos. Em diversos passos, a vários propósitos põe reservas aos antigos e exalta a maior experiência dos modernos e proclama o progresso contínuo. Nota, antecipando-se aos românticos, que os gostos variam com o tempo.
Há pequenos esboços de atitude ensaística em certas obras, como no estilo corrente na carta de guia, onde critica a erudição. É uma crítica da imitação servil dos antigos clássicos. Aristotélico, tem o culto escolástico da autoridade e usa o pejorativo amenista para designar os que dizem amén a tudo. Interessa-se pelas ciências ocultas e escreve o “Tratado da Ciência Cabala”. A prisão prolongada produziu-lhe um abalo psicológico e um desassossego de matriz religioso.

Concepção de arte literária

Não há uma doutrina coerente de poética mas assentos incompletos e contraditórios que variam. Em geral tende para a variedade de gosto e critério. No caso do “Hospital das letras” há pontos de vista antagónicos. O gorgonismo domina a fase inicial da carreira de D. Francisco como poeta. Na última fase pode praticá-lo já banalizado pela moda. Os anos de infortúnio estimularam uma poesia mais directa.
Há um formalismo e conceptismo em D. Francisco. A forma estilística e a métrica têm para ele uma importância fundamental – existe o gosto da inovação formal, no tratamento das variadíssimas formas de versos como os encavalgamentos e até o poema em verso livre, sem rima nem ritmo regular.
Quanto às obras em prosa, a carta de guia é um modelo de exposição clara. Os “Apólogos dialogais” em tom popular e estilo coloquial exigiram grande preparação. “O Hospital das letras” é um diálogo que se trava imaginariamente entre os livros de quatro autores (mas depressa o leitor se esquece disso e imagina estar em presença de quatro personalidades, representantes de outros pontos de vista doutrinários). É um diálogo didáctico.
Em “O escritório avarento” e “Relógios falantes”, os relógios ou moedas contam a sua acidentada autobiografia, através das mais diversas classes sociais e ocupações humanas. São duas obras-primas da observação avulsa de costumes.

Historiador

No “Hospital das letras” discutem-se dois tipos de historiografia: a narrativa simples e a relação entremeada de ilações psicológicas e morais. O género mais cultivado por D. Francisco foi a epanáfora – relações de testemunho pessoal o que proporciona muita animação dramática e observação concreta. As epanáforas contêm informações curiosas e retratos dramatizados. A “Epanáfora política”, sobre as alterações de Évora de 1637, é o mais notável documento de história social desde Fernão Lopes.
D. Francisco não tinha nem temperamento nem condições para uma historiografia de fôlego. Nas epanáforas a precisão de dados geográficos deixam a desejar e a história do suposto primeiro descobrimento da Madeira interessa principalmente como um romance sentimental. Esta epanáfora condena moralmente os amores do casal lendário.
O que mais importa em D. Francisco é a sua própria personalidade e a sua observação de costumes. Há um misto de sofrimento vivido e amaneiramento académico.

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quarta-feira, 1 de julho de 2009

Suicídio juvenil


Numa altura em que grande parte dos alunos do ensino superior enfrenta uma época de exames, publicamos uma reportagem sobre o suicídio entre os estudantes daquele grau em Coimbra. Quando nada parece valer a pena.

Texto Elisabete Paulos Ribeiro

Falar desta “solução permanente para problemas temporários” ainda é tabu. O suicídio entre os jovens afecta quem não vislumbra alternativa para lidar com problemas emocionais, com o insucesso escolar e com as dificuldades económicas. O fenómeno é complexo e implica um trabalho conjunto de prevenção, envolvendo a escola, a comunidade, serviços de saúde e de apoio social.
“Cheguei a pôr várias vezes a hipótese do suicídio”. A expressão é partilhada por jovens que debatem o “suicídio sem dor”, num fórum na Internet. Pelos comentários, percebe-se que são cada vez mais os jovens que já estiveram de alguma maneira ligados a um dos mais sérios problemas de saúde pública: o suicídio.
A Organização Mundial de Saúde (OMS) define suicídio como um “acto deliberado, iniciado e levado a cabo por um indivíduo com pleno conhecimento ou expectativa de um resultado final”. Carlos Braz Saraiva, psiquiatra responsável pela Consulta de Prevenção de Suicídio nos Hospitais da Universidade de Coimbra (HUC), estabelece as diferenças entre suicídio e para-suicídio: “O para-suicídio está mais ligado à sobrevivência, pois a pessoa em princípio não quer morrer” enquanto “um suicídio só é suicídio se ocorrer morte”.
O, também, professor da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra (FMUC) esclarece que “uma coisa é a ideação de morte onde pode haver, inclusive, uma questão filosófica ou de inquietação própria da juventude sobre o que é viver e o que é morrer, e outra coisa é a ideação suicida onde existe um plano de auto-aniquilação”. Daniel Sampaio, médico e coordenador do Núcleo de Estudos do Suicídio (NES), refere no seu livro "Tudo o que temos cá dentro", que “o suicídio é uma estratégia, às vezes uma táctica de sobrevivência quando o gesto falha, tudo se modifica em redor após a tentativa” e de acordo com o especialista está “Maria”, nome fictício, que aos 17 anos tentou suicidar-se. Hoje, passados dois anos, está “a recuperar amigos que se afastaram porque ficaram em choque”.
Ajuda ao alcance de todos
Em Coimbra, não há dados estatísticos que permitam quantificar as tentativas de suicídios entre os jovens que estudam no Ensino Superior, embora sejam conhecidos diversos casos entre a comunidade universitária, diz Braz Saraiva. Para ajudar os estudantes que se encontram em situações de perturbação emocional e comportamental foram criados, há dez anos, o Gabinete de Aconselhamento Psicopedagógico dos Serviços de Acção Social da Universidade de Coimbra (GAP-SASUC) e o Gabinete de Psicologia dos Serviços de Acção Social do Instituto Politécnico de Coimbra (GP-SASIPC). Para além dos alunos, auxiliam também docentes e funcionários das respectivas instituições. A média de idades entre os dois gabinetes difere. No Gabinete de Aconselhamento Psicopedagógico dos SASUC a faixa etária situa-se nos 24 anos, já no Gabinete de Psicologia dos SASIPC são maioritariamente estudantes de 22 anos que recorrem aos serviços.
Quanto à afluência aos serviços do GP-SASIPC a psicóloga responsável pelo gabinete, Helena Moura, refere que “a lista de espera está sempre a aumentar”. Já a psicóloga do GAP-SASUC, Ana Carvalhal de Melo, revela que o gabinete tem “um número de consultas elevado, chegando quase às mil consultas por ano”. As duas médicas estão de acordo quanto à necessidade de acompanhar os estudantes desde o seu ingresso no Ensino Superior. “Muitos alunos sofrem com o processo de transição da escola secundária para o ensino superior, mas é curioso porque os alunos do primeiro ano não nos procuram, são mais alunos do segundo e do terceiro ano”, afirma Ana Carvalhal de Melo. Helena Moura acrescenta: “Infelizmente há situações que só apanhamos no segundo ano e que se tivéssemos apanhado logo no primeiro ano não teriam sido tão graves”.
Ao depararem-se com casos mais problemáticos, os dois gabinetes de psicologia das instituições de Ensino Superior de Coimbra, encaminham os jovens para os Serviços de Psiquiatria dos HUC, que dispõe de uma Consulta de Prevenção do Suicídio (CPS), que não tem lista de espera e que visa prioritariamente observar jovens que cometeram tentativas de suicídio e que foram observados primeiramente na urgência. Segundo Braz Saraiva quem frequenta mais a CPS são as pessoas entre os 15 e os 24 anos. A maior parte dos casos de tentativas de suicídio que dá entrada nas urgências dos HUC deve-se a cortes e à ingestão de medicamentos ou tóxicos.
Tanto nos gabinetes de psicologia da Universidade de Coimbra (UC), como do Instituto Politécnico de Coimbra (IPC) e na Consulta de Prevenção de Suicídio do Serviço de Psiquiatria dos HUC, são maioritariamente raparigas que pedem ajuda. Embora a psicóloga do GP-SASIPC mencione que “surgem cada vez mais rapazes”. De acordo está a Linha SOS-Estudante que recebe mais chamadas de pessoas do sexo masculino.
“A Linha SOS-Estudante foi criada em 1997 com o objectivo de combater algumas falhas que um dos estudantes de Coimbra notou”, conta a vice-presidente da linha, Ana Margarida Teixeira. É uma linha telefónica de apoio emocional e prevenção ao suicídio, sendo ao mesmo tempo uma Secção Cultural da Associação Académica de Coimbra (AAC). Este projecto é actualmente constituído por 22 estudantes voluntários que receberam formação “tendo em conta algumas temáticas principais nomeadamente a prevenção do suicídio e outros temas mais recorrentes como a solidão e a sexualidade” como explica a vice-presidente da linha.
O reduzido horário de funcionamento, das 20h às 01h, deve-se, principalmente, ao insuficiente número de voluntários. A SOS-Estudante recebe em média três a cinco telefonemas por dia de Portugal Continental e Ilhas. “Um pouco contra os nossos objectivos iniciais, actualmente, a faixa etária que liga é dos 40 anos para cima”, afirma Ana Margarida Teixeira. Também contrariando os objectivos primários deste projecto, a maioria das chamadas rondam os temas da solidão e da sexualidade. A vice-presidente da linha afirma que a SOS-Estudante “tem pouquíssimas chamadas de suicídio e a nível de estatística em apenas um por cento das chamadas são identificados alguns factores de risco e outras coisas que levem a pensar numa ideação suicida”.
Exceptuando o Instituto Superior de Educação de Coimbra (ISEC) que às quintas-feiras recebe a psicóloga responsável pelo GP-SASIPC, a Escola Superior de Educação de Coimbra (ESEC) é a única instituição do ensino superior da cidade que possui um espaço nas suas instalações para consultas de psicologia e que tem sempre uma psicóloga disponível para apoiar os seus estudantes. A responsável pelo serviço, Catarina Neves, revela que não existem muitos estudantes em risco de suicídio na escola e que “o facto do gabinete não estar num local muito movimentado ajuda a que os alunos venham conversar sobre os mais diversos temas principalmente entre os meses de Fevereiro e Julho”.
Problemas emocionais e escolares
As causas mais apontadas pelos jovens que recorrerem aos serviços de psico-terapia são, essencialmente, os problemas afectivos e escolares. Ana Carvalhal de Melo refere que os motivos que levam os estudantes a entrar em situações de risco são “problemas de ordem emocional (rupturas afectivas/depressão), insucesso escolar e suas consequências (a nível da auto-estima), problemas de autonomia e problemas económicos”.
O Gabinete de Psicologia dos SASIPC acompanha, actualmente “talvez uns três estudantes em risco de suicídio, embora com graus e riscos diferentes”. O Gabinete de Aconselhamento Psicopedagógico dos SASUC, segundo Ana Carvalhal de Melo, não tem estudantes em risco declarado de suicídio já que, nesses casos, “os jovens são encaminhados imediatamente ou para as urgências ou para a Consulta de Prevenção de Suicídio dos HUC”. “Aquilo que pode acontecer é algumas das pessoas que estão a ser seguidas em situação de crise tentarem o suicídio”, refere.
Quanto às épocas em que recebem mais pedidos de ajuda os dados divergem. “Apesar de haver algumas oscilações em determinados meses do ano não é estatisticamente significativo”, afirma Carlos Braz Saraiva. Helena Moura refere que “na altura da Queima das Fitas há sempre um ou outro caso mediático” e Ana Carvalhal Melo garante que “existem épocas do ano em que a procura é maior e situa-se à volta de Fevereiro, Março e também em Maio, Junho e Julho”.
Os estudantes suicidas “são normalmente pessoas impulsivas, com uma pobre auto-estima, que não conseguem visualizar ou pensar em alternativas para resolver os seus problemas e portanto o suicídio aparece como solução”, segundo a psicóloga do Gabinete de Aconselhamento Psicopedagógico dos SASUC. Esta técnica acrescenta ainda que “existem sempre factores de personalidade que estão por trás destas situações catastróficas”. “Maria”, explica que quando tentou pôr fim à vida, penso que “era uma opção que à partida ia resolver os meus problemas e me ajudava a parar de pensar em tudo”. Braz Saraiva adianta no seu mais recente livro Estudos sobre o para-suicído que o perfil é o de “uma jovem estudante, classe baixa ou média-baixa, problemas afectivos ou escolares, com mau relacionamento familiar, [...] história familiar de doenças psiquiátricas”. São também, em grande parte, estudantes deslocados que recorrem aos gabinetes de psicologia da UC e do IPC.
Estar alerta
Em 1999, Daniel Sampaio alertava na revista "Adolescentes" para a eventualidade do bem-estar de um jovem poder “esconder um grande sofrimento interior, que só uma relação de maior proximidade poderá detectar”. “Acima de tudo estar atento”, é assim que a vice-presidente da Linha SOS-Estudante define o que deve uma pessoa fazer quando repara que um amigo está a pensar em suicídio. Helena Moura realça a importância das amizades e adianta que “devemos recorrer aos amigos e aos familiares e se mesmo assim virmos que não conseguimos ultrapassar os problemas, devemos pedir ajuda a técnicos”. Já Ana Carvalhal de Melo aconselha a que se converse com o potencial suicida e a “nunca tratar o suicídio como tabu”. “Foram os meus amigos que me estenderam a mão e me arrancaram da angústia em que estava”, conta a estudante “Maria”. O responsável pela CPS dos HUC sintetiza: “No fundo, há duas regras básicas que são: criar proximidade e encontrar alternativas”.
No entanto, é importante realçar que os jovens têm mais à vontade para falar sobre os seus problemas com os psicólogos e/ou psiquiatras, que são pessoas que não conhecem do que com amigos, familiares ou namorados/as. A psicóloga do Gabinete de Aconselhamento Psicopedagógico dos SASUC realça a visão imparcial do psico-terapeuta e explica da seguinte maneira esta tendência: “Quando alguém recorre a um psiquiatra ou psicólogo é porque procura alguém que tem bases teóricas e conhecimentos que permitam compreender essa pessoa e que está disponível para ouvir sem fazer juízos de valor nem julgamentos.”
O Núcleo de Estudos do Suicídio (NES) defende que a eficácia dos serviços de apoio depende da facilidade de acesso, proximidade, disponibilidade, divulgação e difusão para as comunidades a que se destinam. A consciência das limitações por parte dos gabinetes de apoio e a sua articulação com serviços de saúde especializados também contribuem para uma maior eficácia na prevenção do suicídio.
Prevenir é essencial
Para um psico-terapeuta, perder um paciente devido a um suicídio é “a maior angústia”, como explica Ana Carvalhal de Melo: “Alguém que trabalhe nesta área tem que se arriscar a que isso aconteça”, mas “é sempre uma ferida que fica. Cura-se mas a marca está lá”. Carlos Braz Saraiva conta que se sente “desconfortável” e que se interroga: “Será que fiz tudo o que deveria ter feito?”.
Porém o psiquiatra, comparando o nosso país com outros países do Mundo, revela que “em Portugal o suicídio do adolescente ou do jovem não é um problema tão dramático como noutros países, como por exemplo em Inglaterra” e adianta que existe sim o problema do suicídio dos idosos, mencionando que “em 2002, pela primeira vez, suicidaram-se 60 adolescentes em Portugal. Mas suicidaram-se por exemplo mais de 500 ou 600 idosos. Portanto, dez vezes mais”.
A prevenção do suicídio é bastante importante e programas de prevenção que trabalhem várias dimensões como a assertividade, a autonomia e a confiança, vão fazer com que os jovens se tornem mais capacitados para lidarem com as várias situações e problemas que vão encontrar nos seus quotidianos. Braz Saraiva refere que o suicídio abrange “fenómenos que são complexos e multi-determinados: “Muitas vezes, aquilo que se verifica é que estes jovens, à semelhança da sociedade actual, lidam muito mal com três factores: o tempo, o poder e os afectos em geral”. Para o professor da FMUC, os jovens actualmente não estão “programados para perceber que há cinzentos entre o preto e o branco”. Também Helena Moura realça que deve existir “prevenção em todos os níveis” enumerados por Braz Saraiva, no seu livro Estudos sobre o para-suicídio: comunidade, saúde, escola e política social.
A psicóloga do GP-SASIPC defende o desenvolvimento de projectos nas residências e entre alunos: “Ainda há muito a fazer e nem é preciso dinheiro, é preciso é tempo e vontade”. Ana Carvalhal de Melo realça a importância do programa de apoio “pares por pares”. Este é um programa relativamente inovador que já foi experimentado noutros países e que para a psicóloga “faz muito sentido pois são alunos que recebem formação básica, que têm um acompanhamento especial por parte do Gabinete e que apoiam e orientam em particular outros colegas”. A psico-terapeuta do GAP-SASUC alerta para a necessidade de existirem programas de prevenção a nível do ensino superior e defende que para prevenir o suicídio deve-se “procurar fomentar as relações inter-pessoais dos alunos, ajudando-os a serem mais auto-afirmativos, mais assertivos, a comunicar com os outros quando têm problemas e a conseguirem reclamar pelos seus direitos sem serem agressivos. Isto a nível pessoal pode ajudá-los a sentirem-se mais fortes, a conseguirem resolver os seus problemas com mais facilidade e portanto o suicídio nem lhes passa pela cabeça como solução”.
Como comenta um jovem no fórum onde se debate o “suicídio sem dor”: “Há sempre uma solução, há sempre algo de belo pelo qual vale a pena viver”.

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